domingo, 1 de julho de 2012

A Índia continua a ser a Índia!

Estou num páteo, que não é o das cantigas, sei isso pois o templo que se ergue do chão à minha frente, em pedra vermelha e gasta pelo tempo, numa arquitectura medieval árabe com um Ganesh no local de destaque da divindade, relembra-me que de certo não estou em Lisboa. Bolas, logo agora que quando ao anoitecer me estendo no terraço, do prédio em frente ao hostel, a mirar os prédios e templos que se erguem colina acima, colina abaixo, cumeados maioritariamente por terraços e com alguns telhados de quando em vez, que se vão seguindo em fila e onde algumas torres se erguem mais alto num esforço vão por ficarem direitas numa guarda constante e secular da vida que decorre pacata e caótica nas ruelas apertadas por prédios, vacas, cães, pessoas que passam a pé ou de mota e lixo. O factor comum nesta imagem e também com Lisboa, é que tudo, literalmente tudo, termina no rio que banha esta cidade e de onde ela floresce para toda a eternidade: Varanasi.

Espaços ocupados por ...

Vista do hostel, terraços e sonhos.

Vias agitadas nesta cidade.

Portas dos sonhos têm de ser um sonho em si.

Andar nestas ruas é como andar no tempo, pular para o passado europeu e árabe enquanto nos perdemos pelos traços da história. Caminhar nas ruas estreitas é uma aventura sensorial, para todos os sentidos serem estimulados ao bom velho estilo indiano. Desde as músicas que ecoam pelas ruas oriundas dos templos ou terraços onde uma cerimónia religiosa ou um concerto acontecem, à linguagem exótica que nos espera em cada passo, o fedor do esterco de vaca, cães e pessoas misturados com lixo, com incensos ou com cheiros de comida, suór, calor, tudo. Passando pelos sabores de diferentes cozinhas: muçulmana; hindu; ocidental, etc. As cores da pele e das vestes de pessoas altas, baixas, ricas, pobres, sadus, gurus, turistas, viajantes e muito mais. O toque de têxteis, pedras, água do ganges, cumprimentos e conversas prolongadas com pessoas sedentas de nós e de quem somos (e por vezes do nosso dinheiro), permite viver uma experiência sem par nesta cidade. Tudo isto é a Índia e tudo isto vai ser sempre a Índia, conjunto de mil e uma razões, deuses, cores e povos que no final funcionam como uma chama eterna.

Vai um leque?

Sari, que magia são os saris por estas bandas.

Quero, huuum, um pacote de pó para lavar roupa !?

Meditar, rezar, orar, comunicar, quando quiser, onde quiser!

Dosa, comida do sul da Índia.

Passando o tempo há porta de casa :)

Pelos caminhos da vida.

Poses.

Just married!

Ah, espera ...

Velas? Flores? Eu vejo-vos!

Harmonia!

há espera da Puja (cerimónia religiosa)

As crianças brincam nas ruas a mil e um jogos perdidos na nossa memória de adultos: apanhada, ludo, escondidas, competições de papagaios ou, aqui mais que em lado algum, cricket. Os adultos passam em passo acelerado a caminho da sua vida agitada enquanto outros apenas tentam angariar clientes para as suas lojas ou negócios. As mulheres que não podem assistir às cremações caminham solene e tristemente das casas onde se despediram dos seus familiares partidos. Os hindus, baba jis, gurus e outros que tal passeiam-se nos seus trajes inexistentes ou típicos com tons de laranja bem vivos e a marca indistinta das suas crenças traduzidas pela cor e desenho do pó que colocam no centro da testa enquanto se cruzam com os poucos turistas que a monção não afugentou. Monção esta que é mais teórica que prática, visto que o calor está aqui a rondar os 40 e muitos graus, sem chuva e nuvens mas com sol intenso. É terrível quando cortam a electricidade sem avisar e muitos hosteis e casas apenas têm esta fonte energética como origem do ar um  pouco menos quente que circula nas suas casas! Enfim está para vir a chuva. Quanto a mim passeio-me por estas ruas tentanto evitar o esterco, os cães doentes, uma vaca descontrolada a correr pela rua fora e a levar tudo à frente, corridas contra os mais profundos cheiros e com a Lauren a meter-me com os miúdos e com todos os que vão sorrindo desconfiadamente para a lente da máquina fotográfica. É uma experiência tão rica esta.


A vida é assim por aqui.


Músculos e yoga.


Olhares que falam.


Puja.


Brincadeiras a mais que dois ...


Ganga river, sacred, want some water? Take picture! Sacred Ganga!!!

Em Varanasi encontra-se ainda uma simbiose encantadora entre a morte e a vida, o final e o principal, e que corresponde ao meio deste ciclo, decorre com toda a normalidade em torno da própria vida. Corpos casados e corpos cremados as duas fontes principais de energia que colocam esta cidade entre as mais espirituais do mundo. O ser humano conta a sua história ou as suas estórias, através de mitos, de deuses, de revelações e se analisarmos tudo isso é algo que até faz sentido na medida em que nos dá algo em que confiar, em que nos rever e alcançar. Desde que se saiba onde está o limite entre nós e o que os mitos são, penso que podemos retirar ideias e viver experimentando rodeados por estes mitos. Por o exemplo, os hindus e a forma como olham para o Ganges como a sua mãe, fonte eterna de vida, energia, amor e que tudo limpa e lava. Por isso se lavam eles e os seus pecados neste rio, por isso aqui se queimam ou afundam corpos de vidas terminadas. Tudo isto com toda a confiança de que ao se banharem nada os vai afectar pois o rio, tal como a sua mãe, apenas quer o melhor para os seus filhos e tomará conta deles, por isso são extremamente felizes enquanto o fazem e isso transparece em todo o seu ser. Reparem na moldura energética que este mito criou e que se vive nesta cidade. De outra forma isto era inexistente e seríamos apenas mais máquinas do que o que somos, mais lógicos e distantes de nós, dos nossos instintos, o Ganges seria apenas mais um rio como outro qualquer. Daqui podemos extrapolar que todos os rios são dadores de vida e de energia e como tal podemos ser felizes ao banhar-nos nas suas águas enquanto sentimos toda essa energia a envolver-nos e elevar-nos. Ao mesmo tempo temos de perceber quem somos nós no meio disto tudo e questionar todas estas crenças de forma a que onde quer que seja que coloquemos a nossa confiança, o façamos para algo que é nosso, que sentimos e vivemos como nosso. Desta forma a religião é um bem que não se quer, pois se somos sãos connosco próprios e vivemos a vida experimentando e crescendo interna como externamente, para que precisamos de seguir crenças que nos fazem criar barreiras e limites à exploração da vida? No entanto não vou deixar de beber esta energia que Varanasi cria em seu redor e se sente em cada passo, respiração, cheiros, vistas e sabores que cada pessoa coloca no mínimo gesto, na menor expressão para representar estes rituais de vida, morte e amor.

Banhos no ganges em família.

Banhos no ganges com amigos.

Orgulhosa avó.

Banhos no rio em comunidade.

A Índia tem um cheiro próprio, tem um ar próprio e nunca encontrei nada como aqui, como as estórias, mitos e pessoas que se vivem nesta terra e que nos fazem sonhar, viver e encontrar no meio do turbilhão de emoções e sentidos que nos assaltam.


Claro, as sempre presentes beldades indianas!

6 comentários:

  1. Muito bom. Gostei muito, Nuno Cruz. Obrigada por me teres permitido viajar na Índia comodamente instalada em frente ao PC.Maria José

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    1. Obrigado. Eh um prazer e a ideia e mesmo essa fazer os outros viajar enquanto tambem eu viajo! :)

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  2. "uma vaca descontrolada a correr pela rua fora e a levar tudo à frente," (⊙_⊙)? 你做了什么给她? Muito cuidado ;P Frase típica do viajante asiático: «Hey! O que te aconteceu? Andaste à porrada!?»... «Mmm... Não me lembro muito bem, mas acho que fui arrastado por uma vaca tresloucada num mercado Indiano»
    (⊙o⊙)哦

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    1. Nao, nao, foi sorte nada mais, mas uma delas bem que me deu uma marrada e me ia furando o saco, tive para onde saltar na rua apertada felizmente :P E entao as Chinas como andam? As relacoes novas prosperam??? :D Grande abraco :)

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    1. Hello Hello :D I feel very good indeed! It is an amazing experience with people and culture that make me feel and understand this country much better now! :D India is a place to learn and grown and where everything is possible, since the most incredible stories to the most amazing views and hearts! All together with the most misery and poor people i've met living in terrible, and wanted, conditions. It is all part and i feel in peace now passing here. I let you know more in my CS answer to you ;)

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